Centro
de Recuperação El Shadai
Programa
Terapêutico
Introdução
Histórica
Na
segunda década do século XX foi fundada uma organização religiosa
que tinha por norte o retorno à pureza e inocência, onde os
transtornos mentais e o alcoolismo eram contemplados pelas
preocupações do movimento por serem considerados sinais de
destruição espiritual. As práticas adotadas incluíam a ética do
trabalho, o cuidado mútuo, a orientação partilhada e os valores
religiosos da honestidade, da pureza, do altruísmo e do amor, o
autoexame e o trabalho conjunto. O termo Comunidade Terapêutica foi
primeiro usado por Maxwell Jones, que dirigia o hospital Dingleton,
na Escócia. Jones era um psiquiatra preocupado com o fato de que a
psiquiatria tradicional parecia não estar ajudando os pacientes.
Convidou vários profissionais para o que chamou de “Reunião
Mundial”, visando investigar como falar diretamente com os
pacientes, procurando desmistificar a imagem autoritária dos
profissionais que atuavam nos hospitais, investindo na ideia de
autoajuda, ajuda mútua e de que todos deveriam trabalhar juntos para
ajudarem a si mesmos e aos demais. A natureza terapêutica do
ambiente totalmente fundamentada na abordagem de ajuda mutua manteve
essa característica essencial e diversificou-se, englobando e
combinando com eficácia outros modelos psicossociais, como a
prevenção à recaída, técnicas motivacionais, além de serviços
relacionados à família, educação, trabalho e saúde física e
mental. Com a multiplicação das iniciativas desse modelo de
abordagem terapêutica na América do Norte, a experiência se
multiplicou e nos anos de 1970 as CTs passaram a aparecer e a se
multiplicar no Brasil.
Responsabilidade
A
Comunidade Terapêutica Centro de Recuperação El Shadai se
fundamenta em introduzir de forma permanente na rotina diária de
nosso acolhido uma mudança absoluta de comportamento, iniciando-se
pelo estímulo da sua auto iniciativa, conscientizando-o a agir
sempre com honestidade, pontualidade e transparência, fazendo com
que este possa identificar e criar novas fontes de prazer e
divertimento, resgatando sua autoimagem, autoestima e cidadania,
aprendendo a usar o contexto de vida comunitária para aprender sobre
si mesmo. O método se baseia no tripé oração, trabalho e
disciplina, para o fim de auxiliar o dependente na superação de
transtornos desenvolvidos pelo uso e abuso de substâncias
psicoativas, mediante o gerenciamento dos comportamentos de cada um
através de disciplina positiva que redundará em valores e condutas
socialmente saudáveis. Para que ocorra a recuperação, a
participação e compromisso do dependente para com o tratamento
devem ser irrestritos e sem reservas, pois sem aceitação e
motivação a doença permanecerá em atividade. O não uso de
substâncias psicoativas é condição para que seja alcançada a
recuperação, mas não é condição suficiente para recuperar-se.
Paradigmas
de Atenção
Considerando
que a doença da adicção encontra-se centrada em causas múltiplas,
se busca a análise e compreensão do acolhido em sua totalidade,
sendo que há pontos comuns a serem respeitados para que se possa
garantir efetivamente um melhor resultado no acompanhamento do
indivíduo acolhido na Comunidade. São eles:
(a)
Partilha: Na
Comunidade se busca partilhar os sentimentos e vivências de cada um,
compartilhando as experiências individuais e frustrações com o
grande grupo, reproduzindo a sociedade, a família e a coletividade
em que vivemos.
(b)
Honestidade: “Participe
do grupo e fale coisas de você, não de política, trabalho ou de
outras coisas. Fale do que provoca medo e dor dentro de você.
(Synanon).”
O exercício e prática da honestidade surgiu nas primeiras
Comunidades Terapêuticas com o nome de confissão
aberta ou
auto elevação, com
a ideia de conduzir o indivíduo à comunicação aberta, sem
máscaras, desenvolvendo relações humanas autênticas. Esta prática
leva ao crescimento individual, permitindo ao grupo a possibilidade
de distinguir pessoas e seu comportamento.
Espiritualidade: Com paradigma nos grupos de ajuda dos AA e NA, se busca um ser superior – DEUS – a fim de resgatar a energia espiritual de cada acolhido, encontrando coragem necessária para sua recuperação, enfrentamento de abstinência e reintegração social.
Programa
de Atendimento
Considerando
que o uso de SPA constitui atualmente, um dos maiores desafios da
sociedade moderna, necessário se faz que cada vez mais, as
Comunidades Terapêuticas desenvolvam um Programa de Atenção ao
acolhido que reproduza, de forma mais idêntica possível, a
sociedade em que vivemos. Tendo a sociedade como paradigma, o
Programa é fundamentando na seguinte metodologia:
Atenção
Individual:
Psicológico:
Atendimento semanal, com prioridade ao atendimento individual do
acolhido recém-chegado na Comunidade, bem como daquele que apresenta
conduta instável durante o período de adaptação, considerando que
grande parte das mensagens são ditas sem palavras, onde o
dependente se utiliza da postura corporal, expressão facial e pausas
para se comunicar. A partir da necessidade, é realizada intervenção
sociofamiliar, a fim de detectar pontos nodais que possam estar do
lado de fora da Comunidade, aproximando a rede de pertencimento de
cada indivíduo.
Medicamentoso:
O acolhido, após avaliado e indicado o encaminhamento é dirigido à
rede de saúde pública, com avaliação em psiquiatria, odontologia
e clínica geral, onde sendo constatada a necessidade de intervenção
medicamentosa e mediante a prescrição indicada, a Comunidade mantém
a guarda dos medicamentos e respectiva receita médica.
Nutricional:
O acolhido recebe semanalmente esclarecimentos de profissional da
área de nutrição acerca da manutenção de sua boa saúde física
e mental, baseada em boas práticas de alimentação e higiene e
também, no consumo equilibrado de alimentos, considerando que o uso
de drogas afeta o metabolismo do indivíduo, gerando déficits que
têm como consequências anemias, danos hepáticos e desnutrição,
entre outros problemas.
Físico:
Intervenção semanal de educador físico para o fim de conscientizar
o residente da importância da prática de exercícios o que além de
ser benéfico para a saúde, colabora para o bem estar do acolhido,
gerando satisfação e melhoria de sua condição física e mental.
Cognitivo:
Horário destinado à leitura individual, onde são incitados ao
raciocínio e compreensão, estimulando e despertando habilidades
individuais, aulas multidisciplinar e compreensão e interpretação
de textos.
Plano
Terapêutico Individualizado – PTI
Após
algumas avaliações, passa-se então, à elaboração do PTI,
baseado no conjuntos de informações colhidas pela equipe de apoio
juntamente com a área de psicologia, que leva em consideração a
adesão e/ou resistência do acolhido ao tratamento; seu desejo em
manter-se abstêmio e priorizar seu tratamento; grau de consciência
acerca dos prejuízos causados pela opção de consumir SPA; situação
e posição do núcleo familiar frente ao acolhido e condições
clínicas e psíquicas. Anexo ao PTI são registradas as
intercorrências e a evolução do tratamento, se constituindo como
ferramenta de construção da recuperação do residente. O PTI
será composto pelo cadastro individual do acolhido, cadastro
sociofamiliar, registro de atendimentos e registro de acompanhamento
realizado pelo grupo de atenção da comunidade (coordenador,
monitor, psicologa e equipe de apoio).
Atenção
Grupal:
Grupo
Terápico: Atendimento em grupo, de forma semanal, os
quais trocam experiências, bem como, seus anseios, além de
trabalhar o convívio em grupo, o respeito ao próximo e a
conscientização da necessidade de mudança dos hábitos mais
elementares.
Reunião
Matinal:
Diariamente
e sob a orientação de monitor, conselheiro e/ou coordenador, se
trabalha positivamente o início de cada dia como mais um dia
“LIMPO”, realizando-se, logo após o café da manhã, a leitura
de provérbios com a explanação de cada residente sobre o tema do
dia. A
Reunião Matinal é também um espaço dedicado a uma revisão
objetiva da vida no grupo, onde todos os participantes podem também
demonstrar sua preocupação responsável e influenciar, de maneira
significativa, o ambiente social da comunidade.
A
Dinâmica dos 12 Passos dos Narcóticos Anônimos/Alcoólicos
Anônimos:
O
indivíduo é direcionado a primeiramente, admitir sua condição de
dependente químico, passando então à busca de autoconhecimento,
confiança e reconhecimento de sua situação de vulnerabilidade
frente às drogas, devendo criar mecanismos que o mantenha ou possa
mantê-lo afastado dos meios que lhe coloquem em situação de risco.
Trata-se
de um processo de mudanças no campo espiritual e emocional . Neste
momento, também o acolhido recebe informações sobre o uso e abuso
das SPA.
Reunião
de Sentimentos:
sob a coordenação da psicóloga, onde, semanalmente, os residentes
trabalham em grupo, compartilhando as suas dificuldades físicas e
mentais (primeiras semanas – síndrome da abstinência) , bem como
eventuais intercorrências havidas durante a semana, buscando ao
final de cada encontro, restabelecer o equilíbrio individual de cada
um e o equilíbrio em grupo, aumento da auto-estima, minimização
dos sofrimentos, maior aceitação de si mesmo. Este
grupo prepara, inicialmente, o residente, para não responder
imediatamente aos seus sentimentos, aprendendo a “dominá-los” e
a deixá-los livre no momento e maneira apropriados. Esse aprendizado
na Comunidade Terapêutica o treinará para a reinserção social.
Prevenção
à recaída:
É um conjunto de habilidades e modificações no estilo de vida da
pessoa para evitar a recaída, visando a identificação de
situações diversas e a forma como se lidará com ela, considerando
a existência ou não de zona de risco. Busca a modificação de seu
modo de viver, inclusive suas atitudes frente a uma situação
vulnerável, preparando o indivíduo para enfrentar ou não a
situação adversa (resposta de enfrentamento). Se procura sempre
estar atento para
alertar e/ou ajudar o individuo, observando alguns sinais e sintomas
físicos e emocionais que ocorrem neste processo que caso não
identificados ou trabalhados a tempo, podem levá-lo a reincidir no
consumo de drogas. Para
que o programa tenha sucesso, é necessário que sejam realizados
grupos regularmente, ressaltando a importância da honestidade e
falando sobre o uso; os sentimentos e os desejos, tudo com conteúdo
prático e teórico, transmitindo confiança e conduzindo as
discussões de forma adequada e reflexiva.
Laborterapia:
Além de direcionar o residente para atividades que despertem nele
aprendizado e ocupação, leva este a despertar, também, outras
formas de se relacionar com a vida e com o grupo, onde são
desenvolvidas na Unidade, atividades com o cuidado do espaço físico
comum, manejo na cultura de hortaliças, limpeza da área comum que
ocupam (cozinha, quartos, banheiros, pátio), manejo de alimentos,
conservação de prédio, etc.
Oficinas
Terapêuticas:
Desenvolvimento de técnicas de aprendizagem que possam capacitar o
acolhido para posterior reinserção no mercado de trabalho, com a
realização de oficinas terapêuticas (cursos profissionalizantes,
artes e conhecimento), Projeto Viva Bem (agroecologia – hortaliças,
enxertia, compostagem entre outros), Projeto Reconstruir (cursos de
padaria, confeitaria e afins), Palestras esclarecedoras sobre as SPA.
Atenção
à Família:
Manutenção dos Vínculos : O
acolhido passa a receber visita de seus familiares a partir do 30º
dia de acolhimento. A partir de então, as visitas se dão de forma
quinzenal, sendo que a qualquer momento poderá o familiar ou
responsável realizar contato com a equipe administrativa da
Comunidade, a fim de obter informações acerca do acolhido.
Orientação
à Família: A família do acolhido é orientada à frequentar
grupos de autoajuda como Narcóticos Anônimos, Alcoólicos Anônimos
e Amor Exigente, além de sendo detectada a necessidade, intervenção
periódica do Setor de Psicologia, a fim de receberem a escuta e
orientação necessária.
Programa
de Ressocialização
Consiste
no retorno do acolhido ao seu núcleo familiar, que ocorrerá a
partir do 5º mês de acolhimento, pelo período de 3 dias, e será
concedido mediante avaliação da equipe técnica, a fim de não
expor o indivíduo a nenhuma situação de risco. Tem como um de
seus principais objetivos, identificar as dificuldades de adaptação
e retorno ao meio familiar, buscando os ajustes necessários para sua
reinserção e manutenção de sua abstinência. Neste período, a
equipe técnica realiza permanente contato com o acolhido e seus
familiares, a fim de dar-lhes o acompanhamento necessário durante
sua visita domiciliar.
Programa
de Alta
O
acompanhamento oferecido tem a previsão de no mínimo 9 meses de
acolhimento, podendo o indivíduo permanecer por um tempo maior, a
fim de reforçar sua condição. O fato de atingir o nono mês não
significa ter a garantia de alta. É necessário que haja, no
ambiente que vai acolhê-lo, uma mudança significativa de hábitos e
costumes. O indivíduo não deverá frequentar os mesmos ambientes
de outrora, conviver com as mesmas pessoas e permanecer em meio de
risco. As mudanças externas são necessárias sob pena de
comprometer a construção realizada durante o período de
acolhimento e não ser segura o suficiente para manter estacionada ou
sob controle, a doença enfrentada. Deverá, tanto o adicto em alta
quando seu núcleo familiar selecionar qualitativamente suas relações
e primar pela permanência e frequência em grupos de autoajuda.
Manutenção
de Vínculos com a Comunidade
Após
o desligamento do acolhido, a Comunidade permanecerá em contato com
o acolhido e familiares por período de até um ano, dispensando o
apoio necessário à permanência do adicto em absoluta abstinência.
Desligamento
do Acolhido
Considerando
que o acolhimento se dá de forma voluntária, com os critérios de
admissão, permanência e alta conhecidos previamente pelo acolhido,
poderá a qualquer tempo ocorrer seu desligamento . Este poderá
se dar através de alta terapêutica; Desistência – alta a
pedido; Desligamento – alta administrativa; Desligamento em caso
de mandado judicial e Evasão – fuga, fato que será imediatamente
comunicado ao responsável ou familiar.
Reunião
de Equipe
Realizam-se
reuniões periódicas da equipe técnica, a fim de traçar metas para
para manter o grupo saudável e coeso, reforçando os vínculos entre
os membros da equipe e buscando sempre reproduzir de forma positiva
os objetivos que norteiam o programa de recuperação e sua execução,
de forma mais humanizada possível.
Contrarreferência
O
município de Camaquã possui na rede de atendimento, o serviço do
CAPS, o qual possui profissionais na área de saúde mental para
acompanhamento pós-alta, bem como grupos de autoajuda pontuais como
NA, AA e Amor Exigente.
Considerações
Finais
Questões
outras não enfrentadas por este Programa Terapêutico serão
submetidas à avaliação da equipe Diretiva, Técnica e
Administrativa da Comunidade que a consenso avaliará cada situação
de forma singular, priorizando sempre a redução de danos,
valorização e proteção de nosso acolhido.